ACNE DA MULHER ADULTA
A acne da mulher adulta é conceituada como o quadro acneico presente em mulheres a partir dos 25 anos. Pode iniciar-se na adolescência e persistir até a idade adulta ou surgir nesta última fase. Influencia as relações pessoais, podendo levar à introspecção e depressão. Estudos epidemiológicos mostram prevalência da patologia em até 41% das mulheres em idade adulta.
As causas da acne na idade adulta ainda não foram completamente elucidadas. A patogênese desse quadro envolve os quatro processos etiopatogênicos básicos da acne vulgar, i.e. hiperqueratinização folicular, hipersecreção sebácea, colonização bacteriana, principalmente pelo Propionibacterium acnes (P.acnes) e a inflamação dérmica periglandular, bem como alterações sistêmicas e teciduais do metabolismo andrógeno e outros fatores diversos. Dentre os últimos destacam-se a hereditariedade, o estresse, a exposição à radiação ultravioleta, a obesidade, a alimentação, o tabagismo e a presença de doenças endócrinas associadas. Na mulher, a maior produção de androgênios ocorre na glândula adrenal e nos ovários, porém, destaca-se também a produção periférica desses hormônios na unidade pilossebácea.
A Tabela 1 apresenta a classificação da acne mulher adulta quanto a idade de aparecimento.
Quanto a etiopatogênia da acne na mulher adulta alguns fatores são muito relevantes e merecem uma discussão individualizada:
1) Aumento da sensibilidade da glândula sebácea aos hormônios androgênicos: observa-se hipersensibilidade dos receptores encontrados nos sebócitos e queratinócitos aos hormônios androgênicos circulantes. Essa hipótese é baseada em análises clínicas como o agravo do quadro acneico no período pré-menstrual, na pré-menopausa, na gravidez e durante o uso de contraceptivos progestínicos. Nesses períodos ocorre aumento relativo dos hormônios com maior atividade androgênica, em relação ao estradiol.
2) Aumento da conversão hormonal periférica: hiperatividade e atividade anormal de enzimas relacionadas ao metabolismo de hormônios androgênicos como a 5-alfarredutase, a 3-beta-hidroxiesteróide-desidrogenase e a 17-hidroxiesteróide-desidrogenase, com aumento da conversão periférica dos pré-hormônios (SDHEA, androstenediona e testosterona) em hormônios androgênicos mais potentes (testosterona e DHT).
3) Deficiência da imunidade inata com atividade anormal dos receptores toll-like ou defensinas, que induziriam a redução da resistência ao P.acnes e inflamação crônica das glândulas sebáceas. A deficiência da imunidade inata é determinada geneticamente, e essa pode ser a explicação da ocorrência familiar.
4) Participação do fator de crescimento insulina símile 1 (IGF 1) como estimulador da produção hormonal androgênica ovariana e cofator na disponibilidade dos hormônios circulantes, a partir de sua ação como redutor da produção hepática da globulina carreadora dos hormônios sexuais (SHBG).
Diversos outros fatores têm sido associados ao surgimento da acne na mulher adulta, dando a mesma caráter multifatorial. A predisposição genética, o estresse crônico (mediado pela substância P), o tabagismo (através da ação da acetilcolina sobre os sebócito por estímulo da nicotina) e fatores alimentares (dieta rica em glicídeos e uso de suplementos alimentares ricos em aminoácidos de cadeia ramificada - wheyprotein - obtido a partir do soro do leite bovino.
Estudo realizado com 30 participantes que faziam uso de wheyprotein mostrou que, após dois meses de uso, 100% dos usuários desenvolveram acne inflamatória do grau III ou apresentaram agravo de algum quadro preexistente.Tese de dissertação de mestrado realizada com mulheres adultas com acne mostrou que as usuárias de suplemento alimentar apresentam sete vezes mais chance de desenvolver acne. Aminoácidos, como a lisina, arginina, leucina, iso-leucina e caseína, são capazes de estimular os sebócitos, e alguns desses suplementos apresentam fatores de crescimento que podem estar relacionados ao surgimento da acne.
Pontes TC, Filho GMCF, Trindade ASP, Filho JFS. Incidência de acne vulgar em adultos jovens usuários de suplementos protéico-calóricos na cidade de João Pessoa – PB. An Bras Dermatol. 2013; 88(6):909-14. 26.
Ribeiro, BM. Acne da mulher adulta: análise clínica, etiológica e de imagem. Brasília. Dissertação (Mestrado em Ciências da Saúde) – ESCS/ FEPECS/SES/DF; 2014.
A presença de acne em uma endocrinopatia normalmente vem associada a outros sinais clínicos de hiperandrogenismo, como hirsutismo, seborreia, alopecia, distúrbios menstruais, disfunção ovulatória, infertilidade, puberdade precoce, síndrome metabólica (SM) e virilização. As principais endocrinopatias que cursam com o hiperandrogenismo feminino são a SOP (síndrome dos ovários micropolicisticos), a hiperplasia adrenal congênita tardia ou frustra e, mais raramente, tumores ovarianos, adrenais, hipofisários e hipotalâmicos.
A SOP é considerada a principal causa de hiperandrogenismo no sexo feminino e tem prevalência de 8,5% na população em geral, e apresenta a acne como um dos seus sinais cutâneos junto ao hirsutismo, seborreia e acantose, sobretudo quando da associação de hiperinsulinismo e a resistência periférica aumentada à insulina. Por conseguinte, é relevante a investigação e orientação do paciente quanto a possibilidade de associação da SOP com a síndrome metabólica (obesidade, dislipidemia, diabetes, hipertensão arterial).
Tratamento - Como o tratamento é prolongado, deve-se priorizar um tratamento simples, bem tolerado e de preferência com uma aplicação diária; isso aumenta a adesão ao tratamento em comparação àqueles com duas aplicações diárias. Como normalmente a terapia isolada não é capaz de agir em todas as fases de formação da acne, deve-se optar pelas terapias tópicas combinadas, seguindo um padrão semelhante ao tratamento da acne juvenil vulgar (Tabela 3).
A terapia hormonal é uma excelente escolha para os quadros de acne na idade adulta, associada ou não a hiperandrogenismo (SOP, SAHA). Contraceptivos hormonais orais inibem a secreção de gonadotrofinas, androgênios ovarianos ou adrenais, além de estimularem a síntese hepática de SHBG, o que reduz a concentração plasmática de testosterona livre. Secundariamente, reduzem os níveis de IGF-1 e 5-α redutase. Os contraceptivos orais combinados (ACO), contendo um estrogênio [etinilestradiol (EE)] associado a um progestágeno de segunda geração (levonorgestrel, noretindrona - Level, Ciclo 21) ou de terceira geração (desogestrel, norgestimato e gestodeno - Primera 20, Gracial), ou a um antiandrogênio (acetato de clormadinona, ciproterona, dienogeste, trimegestona e drospirenona - Diane 35, Selene, Qlaira, Yaz, Yasmin), são frequentemente prescritos. Contraceptivos só com progestágeno, incluindo o DIU com liberação de levonorgestrel, frequentemente pioram a acne e devem ser evitados em mulheres com acne sem contraindicações para estrogênios.
Devemos, sempre, suspeitar de desordens endócrinas em mulheres com acne resistente aos tratamentos convencionais. Muitas vezes, cabe à habilidade do médico buscar outras queixas e examinar o paciente de forma global para confirmar um diagnóstico endocrinológico, não se fixando apenas às lesões acneicas que levam o paciente ao consultório. Daí a importâcia da formação generalista do dermatologista. Nesse grupo medicamentoso, temos: 1) antiandrogênicos; 2) bloqueadores de hormônios ovarianos e adrenais; 3) controladores não-hormonais da resistência periférica à insulina; e, no futuro, os 4) inibidores de enzimas envolvidas com o metabolismo androgênico na pele.
O acetato de ciproterona é um potente bloqueador de receptores androgênicos e também inibidor da ovulação. Apresenta ação progestínica e por isso é habitualmente associado ao etinilestradiol como contraceptivo. Pode ser utilizado isoladamente em doses de 25 a 100mg ao dia do quinto ao 14o dia do ciclo menstrual, porém a preferência é para doses baixas combinadas com o etinilestradiol. A utilização dessa combinação vai provocar a melhora da acne da mulher adulta de modo lento, cerca de 30% ao final de três meses de uso, com excelente resposta (90%) ao final de 12 meses de uso e melhora de praticamente 100% ao final de 36 meses de uso.
Já a e espironolactona é utilizada como diurético poupador de potássio, e também age como bloqueador de receptor de andrógenos. Demonstra efeito inibidor da enzima 5-α-redutase assim como da 17-beta hidroxiesteroide desidrogenase (17β-HSD). O ideal é que a espironolactona seja utilizada concomitante com o contraceptivo para evitar a concepção ou evitar os sangramentos interciclos (spots).
A metformina não é um antiandrogênico, mas um agente sensibilizante da insulina (assim como a tiazolidinediona) que aumenta a sensibilidade dos tecidos à ação da insulina. A metformina reduz a gluconeogênese hepática e aumenta a sensibilidade do músculo à insulina, diminuindo a concentração da insulina sérica influenciando diretamente a esteroidogênese ovariana, consequentemente, diminuindo a produção de andrógenos pelas células da teca ovariana.